"A maneira de ajudar os outros é provar-lhes que eles são capazes de pensar."

Dom Hélder Câmaraâmara

quarta-feira, 29 de maio de 2013

“ESTADO PARA QUE E PARA QUEM?” – AS PASTORAIS E MOVIMENTOS SOCIAIS E DISCUTEM A 5ª SEMANA SOCIAL BRASILEIRA EM BELO HORIZONTE


As Pastorais Sociais de Minas Gerais e do Espírito Santo se mobilizam para debater uma nova sociedade a partir da 5ª Semana Social Brasileira (SSB), “Estado para quê e para quem?”. Entre os dias 24 a 26 de maio em Belo Horizonte, os/as militantes sociais de aproximadamente 20 pastorais, organismos e movimentos da Igreja se encontraram no Seminário sobre a SSB, contando a participação de aproximadamente 70 pessoas. Propondo, ouvindo e frutificando este tema, as organizações sociais procuram promover a participação ampla de pessoas e entidades sobre a temática.

Neste Seminário os/as participantes puderam aprofundar a temática da SSB, onde o exercício do debate democrático, o ensaio coletivo de iniciativas transformadoras e a reivindicação de um estado brasileiro que de fato sirva ao bem comum foram pautas trazidas pela ótica das Pastorais e Organismos ligados a Igreja e outros Movimentos Sociais presentes.

Laísa Silva, da Pastoral da Juventude de Belo Horizonte, afirma que a SSB é importante por articular as várias pastorais sociais e por conseguir trazer a construção de um projeto de sociedade comum. Esse tema que está sendo tratado nessa 5ª SSB é uma proposta de construção que já vem de forma transversal desde a primeira semana, segundo Sônia Gomes da Diocese de Montes Claros. Ela também nos diz que este tema “traz a reflexão de como podemos dar uma contribuição para o estado com um modelo novo e que tenha a participação ativa da sociedade, onde tenhamos os direitos garantidos e que precisam ser efetivados a partir do aporte da população brasileira”.

Samuel Silva, da Cáritas Brasileira Regional, diz que a temática trazida nesta Semana Social é de importância latente para o país, pois “historicamente o estado brasileiro sempre esteve a serviço de uma minoria e é um estado que olha sempre para fora e organiza nosso país a partir desse olhar, mesmo desempenhando na esfera mundial um papel menor e de subordinação nas relações internacionais. Então este debate serve para fazer uma avaliação desse estado que temos e a partir dessa avaliação a gente pensar num estado que nós queremos. Fica o desafio para fazermos o esforço das discussões permearem toda sociedade, pois ela não pode ficar circunscrita num círculo de pastorais sociais da igreja e dos movimentos sociais, temos que massificar essa discussão porque o estado tem essa conformação atual justamente por manter uma maioria da população desinformada, desarticulada, desorganizada e oprimida”, afirma Samuel Silva.

O Seminário, que foi o segundo realizado pela Regional Leste II da CNBB, discutiu temas como Diálogo Igreja e Sociedade, Reforma do Estado, A Pastoral Social Hoje, Dilemas da Participação da Sociedade na Democratização do Estado, os Desafios da Evangelização e da Ação Social e uma mesa com as pautas da Luta Contra a Corrupção, Contra o Extermínio da Juventude, Plebiscito Popular sobre a Tarifa da Energia Elétrica, Campanha Permanente Contra o Uso de Agrotóxicos e pela Vida, Lutas Indígenas e o Jornal Brasil de Fato. 

Estes debates tiveram a contribuição do Pe. Manoel Godoy e Pe. Henrique de Moura, Lílian Daniela, Robson Sávio, Frederico Santana e representantes do jornal Brasil de Fato, Movimento Quem Luta Educa, Pastoral da Juventude, Comitê Estadual da Campanha contra os Agrotóxicos e CIMI.


Geovane Rocha – Comunicador Popular

CARTA DA 5ª SEMANA SOCIAL DO REGIONAL LESTE II

“Irmãos, não se conformem as estruturas deste mundo, mas transformem-se pela renovação da mente a fim de distinguir qual é a vontade de Deus”.Rm 12, 1 a 2.
Nós, agentes das pastorais sociais, representantes de 20 dioceses do Regional Leste II, reunidos na escola Sindical 7 de Outubro nos dias 24 a 26 de maio de 2013 em Belo Horizonte/MG, nos juntamos as diversas vozes que ecoam neste país para denunciar e exigir que o Estado Brasileiro de fato esteja a serviço de todos, de modo especial os historicamente excluídos do sistema.
Nestes dias refletimos à luz do evangelho e dos documentos oficiais da igreja, sobre os desafios das pastorais sociais e parceir@s da rede de solidariedade. Concluímos que estamos diante de um Estado que se nega a desenvolver uma política de Reforma Agrária e  regularização fundiária para os povos indígenas e quilombolas; não pauta a Reforma urbana nem política dentre tantas outras pautas urgentes para o nosso projeto. A não garantia de direitos básicos a população como saúde, educação, moradia e trabalho aliados ao extermínio da juventude e a falta de políticas públicas específicas vêm ameaçando o projeto popular para o Brasil. Ao mesmo tempo, assistimos um Estado financiador de grandes projetos econômicos como o de mineração, hidrelétricas, de monoculturas, de irrigação, disponibilizando recursos para beneficiar grandes grupos ligados ao capital financeiro nacional e internacional, propagandeando na mídia a superação da pobreza e da desigualdade social no país.
Estamos enredados nas lutas sociais contrapondo este modelo de desenvolvimento capitalista e destruidor, na perspectiva da participação popular nas principais decisões do país, na realização de plebiscitos e manifestações populares que viabilizem as reformas necessárias.
Por isto propomos:
- Intensificar os processos de articulação com todos as organizações e movimentos urbanos e rurais e com isso acumular as forças para realizarmos as transformações  necessárias para a construção do  Estado que queremos;
- Alterar e ampliar os mecanismos de participação popular através de mudanças na legislação para que de fato a população possa efetivamente decidir sobre as grandes mudanças que afetam a vida das pessoas;
- Desenvolver e fortalecer uma estratégia de comunicação para pautar o nosso projeto junto a população e fazer um contraponto a mensagem repassada pela grande mídia.
Para implementar estas ações, devemos:
- Deflagrar um processo de formação de base, iluminados pela metodologia das CEBs em todas as comunidades, pastorais, paróquias e em outros espaços de forças vivas da sociedade;
- Fortalecer iniciativas de plebiscitos e campanhas populares lideradas pelos movimentos sociais e eclesiais;
- Apoiar as resistências populares na Regional, de modo especial as dos indígenas, quilombolas, pescadores, agricultores famílias, camponeses e sem terra, mulheres, jovens, moradores de rua, encarcerados, idosos,  sem teto, sem água e todas as resistências do povo que fortalecem o projeto popular e o bem viver.
Queremos lembrar o documento da Gaudium et spes, que aborda a importância dos cristãos de sua ação no mundo, visando à construção do bem comum e à promoção da justiça e da paz.
Estamos em um momento desafiador que exige de nós uma mudança de postura e um novo posicionamento frente a estes desafios. Para isto é necessário buscar  permanentemente a unidade e nos mantermos atentos à realidade, visando a compreensão em profundidade e extensão dos problemas que nos cercam, tendo como horizonte o advento de práticas transformadoras. Na comunhão solidária, gestada e nascida da trindade em sintonia com as lutas populares e as resistências do povo seguimos em caminhada rumo a construção do Reino de Deus.
Amém, Axé, Awarê, Oxente, Uai.
Belo Horizonte, 26 de maio de 2013. Festa da Trindade.



terça-feira, 28 de maio de 2013

5ª Semana Social Brasileira acontece em Minas Gerais




MG2

Como parte da preparação da 5ª Semana Social Brasileira iniciada em 2011, as Pastorais Sociais da Igreja Católica de Minas Gerais estão reunidas em Belo Horizonte no Seminário da Semana Social Brasileira desde o dia 24 de maio até este domingo. Os/as militantes sociais iniciaram os debates e reflexões entorno da proposta central da Semana Social, “Estado para Que e para Quem”, com a contribuição do Pe. Manoel Godoy sobre A Pastoral Social e os Desafios da Evangelização e da Ação Social Hoje na noite desta sexta-feira. Este Seminário, que contou com a participação de aproximadamente 70 membros de Pastorais Sociais no primeiro dia, está sendo realizado na Escola Sindical da CUT, e procura promover a participação ampla de pessoas e entidades, a abertura ao ecumenismo, o pluralismo de idéias e valores, o exercício do debate democrático em todas as instâncias e o ensaio coletivo de iniciativas transformadoras.
De forma alegre e descontraída, a manhã deste sábado deu continuidade às discussões do Seminário com o debate trazido pelo Pe. Henrique de Moura Faria “Semana Social Brasileira: Diálogo Igreja e Sociedade”. Discutiu-se também neste período o tema “Reformas do Estado e Reforma Política”, onde contribuíram e mediaram as discussões Lílian Daniela e Robson Sávio, ambos militantes sociais de Belo Horizonte.
Por Geovane Rocha, Comunicadora Popular – Cáritas Diocesana de Almenara, Jequitinhonha/MG

segunda-feira, 27 de maio de 2013

Capelinha sediará III Fórum da Mulher do Jequitinhonha



As atividades desta edição que acontece de 6 a 7 de junho, terão três eixos principais: a formação política e cidadã, a geração de renda e o cyberativismo.

Foto: arquivoCapelinha sediará III Fórum da Mulher do Jequitinhonha
O Fórum, que já está em sua terceira edição, é uma forma de reunir mulheres e dividir experiências que estão espalhadas pelo Vale do Jequitinhonha
Nos dias 6 e 7 de junho, em Capelinha (MG), acontece o III Fórum da Mulher do Jequitinhonha.

As atividades desta edição terão três eixos principais: a formação política e cidadã, a geração de renda e o cyberativismo.

Além dessas questões, um dos momentos do evento será destinado ao planejamento de uma campanha para inserir os homens no combate à violência contra a mulher.

O Fórum, que já está em sua terceira edição, é uma forma de reunir mulheres e dividir experiências que estão espalhadas pelo Vale do Jequitinhonha, além de ser uma oportunidade de formar uma rede que fortalece os movimentos femininos.

 As mulheres ganham voz e ocupam um espaço no processo de ampliação dos seus direitos. Assim, se tornam protagonistas na transformação de suas histórias, lutando por novos rumos da sociedade.

O Fórum da Mulher é uma realização da Pró-Reitoria de Extensão da UFMG e faz parte de outras ações do Programa Polo de Integração da UFMG no Vale do Jequitinhonha.

 

Programação do III Fórum da Mulher do Jequitinhonha

III FÓRUM DA MULHER DO JEQUITINHONHA
6 e 7 de Junho de 2013
Capelinha - MG
LOCAL:         Galpão Cultural Professora Maria Odete Sampaio
                                               Rua Arlindo José de Oliveira s/nº, Bairro das Acácias – Capelinha – MG
COORDENAÇÃO:   Maria das Dores Pimentel Nogueira
            Maria Alice Braga

PROGRAMAÇÃO

Quinta-feira, 6 de junho

08:00 - 8:30    Inscrição

8:30 - 9:00:    Abertura Oficial
Prefeito Municipal de Capelinha: José Antônio Alves de Souza
 Pró-Reitora Adjunta de Extensão e Coordenadora do Programa Polo de Integração da UFMG no Vale do Jequitinhonha: Maria das Dores Pimentel Nogueira (Marizinha)
Presidente da Fundação de Arte de Ouro Preto: Ana Maria Pacheco  Presidente do Conselho de Mulheres de Capelinha: Flávia Roberta Barbosa Fróis

 Apresentação Cultural:       
Meninas da Associação de Mulheres de Capelinha
Canção do Vale: Fátima Neves
09:00 - 11:00  Conferência de Abertura: 
 “A Mulher Rural”
  Conferencista: Flávia Maria Galizoni (UFMG/ICA)
  Debatedoras: Marlise Matos (DCP/UFMG) e representante da Emater
  Depoimentos: Maria Cristina Martins dos Santos e Maria da Conceição Moreira
11:00 - 11:30  Apresentação do Programa Fórum da Mulher do Jequitinhonha: programa aprovado pelo MEC para execução em 2013

11:40 Lançamentos:          
 Álbum do II Fórum da Mulher do Jequitinhonha                                                                                                                                                                               Informativo do Polo Jequitinhonha / UFMG

12:00 - 13:30  Almoço 

13:30 - 14:00  Apresentação das participantes do evento

14:00 - 17:30  Mesa Redonda: "Saberes entre Gerações"
                                                           Palestrantes: Marlise Matos (DCP/UFMG) e Maria Aparecida Moura (CPINFO/UFMG)
                                   Depoimentos: Glória Maria Andrade (artesã de Ponto dos Volantes) e Tereza (benzedeira de Chapada do Norte)

18:00  Apresentação  Cultural: Teatro de Capelinha

Sexta-feira, 7 de junho
08:15 Caboclinhos:  Mestra Dona Maria do São Vicente
8:30 - 11:00    Mesa Redonda:
 "Desafios da Saúde no Vale"
    -          Promoção da saúde e prevenção da violência – Palestrante: Elza Machado de Melo (UFMG/MEDICINA)
  -          Saúde coletiva e a questão da mulher no Vale do Jequitinhonha – Palestrante: Sílvia Regina Paes (UFVJM)
  - Saúde da mulher no Vale do Jequitinhonha –  Palestrante Maria de Jesus Loredo Rocha ("Zuzu", de Araçuaí
Depoimento de parteira indicada pela Associação de Parteiras de Jenipapo de Minas: Geralda Martins Soares

11:00 - 12:00  Relato das ações que resultaram do II Fórum da Mulher do Jequitinhonha / 2012 sobre o encaminhamento de Conselhos da Mulher nos municípios.

12:00  Apresentação Cultural: Dança do Vilão
12:30 - 14:00  Almoço 

14:00 - 17:00  Campanha para envolvimento dos homens no combate à violência contra a mulher
Indicativos e propostas base para a criação de uma campanha no Vale do Jequitinhonha sobre enfrentamento às distintas faces das violências experimentadas contra as mulheres do Vale do Jequitinhonha
Constituição de grupos de trabalho temáticos para elaboração de propostas para envolvimento dos homens no combate à violência contra a mulher
Temas:
a. Violência doméstica/conjugal/sexual
b. Violência no campo/rural
c. Violência Institucional e material
d. Violência no Trabalho

Plenária final: consolidação das sugestões dos grupos de trabalho e encaminhamentos práticos até o próximo Fórum a ser realizado em 2014 e exibição de vídeos confeccionados pelas jovens participantes do evento.
17:00Apresentação  culturalFanfarra Lausoyer
EXPOSIÇÃO: “Vale: Vida”, do artista Lori Figueró
Durante o III Fórum da Mulher do Jequitinhonha haverá a exposição Vale: Vida sobre o povo e modo de vida no Vale Jequitinhonha

27/05/2013 - 13:18 - Fonte: UFMG

terça-feira, 21 de maio de 2013

ELES QUEREM VIVER NO CAMPO. E NÃO DESISTEM.


A história de resistência de quem mora no assentamento Terra Prometida, no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais
Verônica Pragana - Asacom
Felisburgo - MG
13/05/2013
Maíra vive no Terra Prometida por escolha. Trabalha no roçado de dia e à noite ensina adultos a ler e escrever. Fotos: Bi Antunes/Arquivo Asacom
Durante um breve período dos seus 20 anos, Maíra morou em Belo Horizonte, capital mineira, para estudar. Hoje, reside com os pais agricultores na zona rural de um pequeno município de Minas Gerais. D. Modesta, 80, vive sem os filhos que migraram para os centros urbanos. Hélio, mais conhecido como Toquinho, 24, luta para ter condições dignas de criar seus filhos - André de quatro anos e Emanuel de quase dois – no campo.

Maíra, D. Modesta e Toquinho escolheram viver na zona rural. Eles remam contra a maré num país de histórica concentração de terras e prevalência do poder nas mãos de quem tem dinheiro. O Estado que devia servir ao cidadão brasileiro, muitas vezes lhe dá as costas. Essa omissão, bem conhecida deles, tem servido de estímulo para assumirem sua identidade de ‘sem terra’.

Juntos, os três fazem parte do assentamento Terra Prometida, no município de Felisburgo, na região do Vale de Jequitinhonha. Outras 147 pessoas estão assentadas na antiga fazenda Nova Alegria, alojadas com seus pertences em pequenas casas de taipa, um tipo de moradia que reflete a evolução da confiança na posse definitiva da terra. Antes, as casas já foram barracos de lona preta. E um dia se transformarão em casas de tijolo e cimento.

“Estou enfrentando minha sina”, assegura com naturalidade D. Modesta e completa: “Minha família fugiu da seca e veio abrir a mata. Meus tios já falavam da terra como uma herança perdida do nosso povo e sempre diziam que, quem for vivo e tiver coragem, vai receber esta terra de volta”.

O assentamento Terra Prometida já podia ter se tornado Terra Conquistada há muito tempo. Se não fosse a demora no trâmite dos processos judiciais que afetam os interesses dos, desde sempre, donos de terras no Brasil. No dia 20 de agosto de 2009, foi publicado no Diário Oficial da União o decreto de desapropriação da antiga Fazenda Nova Alegria, sob justificativa de crime ambiental. Mas a posse da terra pelas famílias ainda não saiu.

A desapropriação aconteceu quase cinco anos após o Massacre de Felisburgo, que tirou a vida de cinco pais de família, feriu fisicamente outras 12 pessoas e causou traumas psicológicos em crianças, adultos e idosos que ocupavam a fazenda improdutiva.

O mandante confesso do massacre é o antigo proprietário da fazenda, Adriano Chafik, que mesmo respondendo a processo criminal conjuntamente com os pistoleiros, ainda consegue impedir a realização do sonho das famílias da Terra Prometida, porque entrou com um recurso na Justiça Federal contestando a desapropriação da fazenda.

A data do massacre é emblemática: 20 de novembro. Nesse mesmo dia, no ano de 1965, morreu em defesa do quilombo dos Palmares, o seu líder Zumbi, que dedicou sua vida contra a opressão. A data da morte de Zumbi virou dia de celebração da Consciência Negra. Assim como o dia 20 de novembro se tornou para as famílias do assentamento no Vale do Jequitinhonha uma data para celebrar a luta pela Terra Prometida.

Recomeço - Após a tragédia, dezenas de famílias sentiram-se ameaçadas e sem estrutura emocional de continuar no local. Mas o assentamento não se desfez. Pelo contrário. Com a solidariedade e ajuda das famílias acampadas em outras áreas do Estado, a bandeira de luta do Movimento Sem Terra continuou hasteada em outra área da fazenda para ajudar a superar o trauma.

“Quando cheguei ao acampamento e vi a destruição, pensei que tinha acabado [o projeto]. Foi quando uma mulher acompanhada de crianças molhadas da chuva pediram para hastear a bandeira do MST”, relembra Maria Eni, uma liderança no Terra Prometida.

Com o passar do tempo, o Terra Prometida virou símbolo de resistência e referência de acolhimento para as famílias despejadas de acampamentos em municípios vizinhos. “Tal como na Bíblia, o assentamento tem um simbolismo muito forte como um lugar onde se acolhe”, ressalta a religiosa Reginalda Barbosa que acompanha o assentamento há dois anos.

D. Modesta: "Meus tios já falavam da terra como uma herança perdida do nosso povo e sempre diziam que, quem for vivo e tiver coragem, vai receber esta terra de volta”
D. Modesta e a família de Toquinho fazem parte da formação do assentamento pós-massacre. Eles vieram do acampamento de Palmópolis, município a 50 km de Felisburgo, despejado três vezes por ordem da justiça.

Já Maíra, que faz parte de uma família que está no acampamento desde o início da ocupação, presenciou as cenas da destruição que não conseguiram apagar o brilho de seu olhar quando fala da sua opção em morar no assentamento. Integrante do MST desde os 10 anos, Maíra conta que desacostumou a viver só e se identifica com a vida em comunidade: “O problema de um é também seu. Isto torna [o problema] mais fácil de resolver e, ao mesmo tempo, mais difícil”. Ela é professora de adultos na escola improvisada no acampamento.

Assim como Maíra, Toquinho passou quase metade da sua vida na luta pela conquista de terra. Desde os 14 anos em acampamentos do MST, essa vivência o fez desenvolver disciplina e respeito pelo outro. “Ali me senti gente”, traduz em palavras o sentimento de pertencimento ao movimento que mobiliza pessoas para conquistar condições de vida digna na área rural.
Mulher feita de coragemAo chegarmos em Terra Prometida, o primeiro pouso foi a casa de Maíra. Quem nos recebeu foi sua mãe Maria Gomes, a conhecida Eni, mulher de fala segura e tranquila que não esconde que aprendeu a ser forte por necessidade e ideal. Desde o assentamento provisório em 2002, Eni divide com Jorge a liderança do grupo de famílias.

Depois de trocar algumas palavras com os visitantes, Eni aproveitou a participação da filha Maíra na conversa pra passar o café. Tentou fazer mais fraco que de costume, mas apesar do ensejo, o café saiu - nas suas palavras - “corajoso”.

Coragem é um nome frequente no coração e mente de Eni, tanto que repetiu várias vezes durante a entrevista. Também, pudera. Já enfrentou muitas situações em que pessoas de coragem fraca não aguentariam. Ameaças de pistoleiros, perdeu até as contas de quantas recebeu. Apesar do medo, a “sede de ver acontecer a justiça”, segundo suas próprias palavras, a faz seguir firme em seu propósito. “Se parar, é discriminado. Se lutar, também. A gente morrer na luta é melhor do que morrer de fome.”

Começou a desenvolver seu forte senso de justiça desde pequena quando perdeu o pai aos 11 anos. Como filha mais velha, teve que assumir a criação dos quatro irmãos mais novos e precisou trabalhar em casa de família, sem direito a estudar e com salário pouco. Iniciou sua jornada de militante na igreja, depois no sindicato até chegar ao Movimento dos Sem Terra (MST), em 2000.

Fonte: 
ASA Brasil